Final

Eu abro os braços
Sinto o vento
Ar
Gotas
Sinto a Terra.

O ar sufoca o meu respirar
As gotas molham o meu cansaço
A Terra me aleija.

O pulmão freia
O olhar pesa
O mundo acaba.

E eu
Com os braços abertos
Esperando o público
Acabo junto.
''(...) – bem, como vai você? levo assim, calado
de lado do que sonhei um dia
como se a alegria recolhesse a mão
pra não me alcançar

poderia até pensar que foi tudo sonho
ponho meu sapato novo e vou passear
sozinho, como der, eu vou até a beira
besteira qualquer nem choro mais
só levo a saudade morena
e é tudo que vale a pena''


 Sapato Novo - Los Hermanos

Garoto

É um pulsar baixo, cadenciado, que cresce disforme dentro do cúbiculo enegrecido. É um garoto esguio, magricela, deitado na única cama do cúbiculo e que sente o pulsar estourar seus ouvidos. O sangue desliza suavemente pelas suas bochechas, seu pescoço e mancha a pele amarela pálida colada aos ossos. Ossos brutos, duros, não se partem, pesados e barulhentos. Cada movimento é uma imagem silenciosa, como o voo de um pássaro em câmera lenta. O cúbiculo é a praça, a rua, a lanchonete, o salão de festas, o campo de futebol. O cúbiculo é o caminho a ser trilhado. O garoto magricela sobe na cama e com a força dos seus músculos pobres fica em pé. Abre os braços de pele amarela pálida e sente o sangue caminhar pelo seu corpo. Sente o pulsar forte em sua cabeça descer pro seu coração e depois pro seu estômago e para os joelhos e os pés e volta para cabeça e se aloja na suas costas e como uma ventania forte o empurra no chão e então ele cai. Em pé. Rindo a loucura que o toma, que o impulsiona e o faz correr pelo cúbiculo escuro de braços abertos, dando voltas, piruetas, trançandos os pés, balançando os braços, cambalhotas, empurrões, socos, pontapés, cabeçadas e por fim terminar de cara no chão, com o corpo vermelho de sangue, com o sorriso vermelho de sangue, com a pele vermelha de sangue, com a mente vermelha de sangue, com a alma se esvaindo junto com o seu sangue.

Estocolmo

Eu realmente me sinto muito decepcionado ao lembrar do que passamos juntos. Cada minuto, cada sorriso, cada briga, cada lágrima, foi tudo tão desnecessário. Antes eu lembrava da nossa vida juntos e doía, porque sentia saudades, sentia falta da exarcebada alegria que enchia meu coração de paz, mas hoje, eu sinto pena de mim, por ter gasto tanta energia com uma pessoa que não se respeita. Sinto que toda a nossa história está sendo violentada por seus atos, suas mentiras, seu modo de vida, sinto que toda as minhas palavras tão bem ditas estão sendo jogadas num ralo fétido de uma esquina qualquer, sinto que meu coração de nada vale para você, logo você, que foi a pessoa que entreguei-o durante um tanto de tempo. Pura ingenuidade minha. Pura inexperiência. Meu coração ainda virgem e você se apoderou dela, com um sorriso o violentou, abusou da pureza, do meus deslumbramentos, fez de mim seu capacho e quando cansou, me jogou no frio do chão. É realmente decepcionante olhar para o passado, olhar para o presente, vislumbrar o futuro e saber que não sobrou nada do que vivemos. O que me restou foi a dor, a inquietante dor dos corações que são sequestrados, abusados, partidos e ainda assim continuam apegados aos seus violentadores.

Da Noite Pro Dia

Próximos, quase colados, o sorriso dela está a menos de um palmo de distância e vendo-o de perto, me sinto iluminado por uma estrela. Sinto o doce sabor dos lábios dela misturado com o fervor dos meus desejos profundos. É um beijo. Um selo de amor, um roçar de lábios que mistura paixão amor e tesão. Logo esse beijo nos toma por inteiros e quando menos percebemos, estamos com os corpos colados, nus. Deitados numa cama, enrolados num cobertor. Uma noite inteira rolando num colchão tão macio quanto os seios dela. E quando amanhecer, ainda estaremos acordados, contando histórias e rindo de fatos engraçados que nos fez chegar até aqui. Ela com toda certeza citará alguma piada minha e eu confessarei que desde o primeiro momento em que a vi parada naquela tarde, já pude saber que a desejava imensamente. O sol invade o quarto, o calor invade nossos corações e ainda nus, nos abraçamos, um olhando nos olhos do outro, tentando falar por telepatia o quanto foi mágica a noite que passou. Ela pisca os olhos e sorri. Eu sorrio e pisco os olhos. Momentos depois, ela já está dormindo e eu estou acariciando calmamente o rosto dela, sussurrando baixinho o quanto a manhã está linda hoje.

Se hoje volto a sorrir...

É simplesmente uma tortura olhar seus olhos e não poder mergulhar na escuridão deles. Eu queria poder tocar seu rosto, sentir seus lábios e mostrar a verdade que reside em cada carinho. E quando você sorri, tudo piora. A dor de não tê-la é sufocante, é um rasgo na garganta louca para gritar. Meus pensamentos e sentimentos se confundem, assim como a realidade e os sonhos. Às vezes quando te toco não sei se estou dentro de um sonho ou se vivo aquele momento, pois um turbilhão de sensações me tomam por completo e eu fico entregue à eles, sem força para controlá-los. Sou transportado ao mundo perfeito, criado na minha mente, com leves toques do meu coração.  E quando você se distancia, esse turbilhão vai embora e dar lugar ao vazio que é ser incompleto. Metade de mim está em você. Metade de mim existe por você. Cuide do que sou, não maltrate o que aqui dentro tanto prezo e aprecie nossos poucos momentos juntos. Por favor, perceba-os e me saboreie.